terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Minha Linda Baterista - Capítulo VI : Fama [Conclusão]

 Capítulo VI – Fama


– Com licença, Doutora...

– Cristina, Shirley... me chame de Cristina – falei pela 100° vez e parece que não adianta – Mas sim, sente-se por favor.

– Desculpa... mas a Lu te chama assim o tempo todo... acho que me acostumei – comentou, se sentando.

– Tá bom, tá bom... que tal um Milk Shake de Chocolate?

– Claro...

Acenei para a moça do café e pedi os Milk Shakes de chocolate... um para cada uma... acho que merecia algo doce após os últimos dias... os últimos loucos e frenéticos dias...
Após a pequena cena no aeroporto voltamos para o hotel, no dia seguinte fomos para Santa Catarina, no outro dia houve o show... e depois o mundo enlouqueceu...

– No capricho, Doutora! – disse a moça do café, trazendo meu pedido, pelo qual agradeci.

– Ela te reconheceu? – perguntou Shirley, sem graça.

– Sim... já tirou uma foto também... e perguntou sobre os próximos shows da Lucy...

– Eu nunca imaginaria isso, Dou... Cristina – comentou, começando a beber seu shake.

E quem imaginaria? Mas com dezenas de pessoas filmando a cena da Lucy no aeroporto declarando seu amor, como não imaginar? Os vídeos foram compartilhados milhares de vezes... nós... viralizamos! Viramos trend topic no Twitter... #mocadecamisola... um tópico ridículo... e dezenas de memes...

– A Lu pediu pra eu printar as manchetes nos portais de notícias e sites de celebridades e fofocas... quer ouvir o que já tenho? – perguntou ela, um pouco receosa (não sabia por que).

– Claro... – respondi começando a beber também.

– "Assista ao vídeo da moça de camisola que viralizou na internet", "Moça de camisola chega aos Trend Topics", "Quem é Lucy, a guitarrista de camisola", "Descobrimos onde Lucy (a moça de camisola) vai tocar"... errr... "Exclusivo: Descobrimos quem é a Doutora".

– Como é??? – perguntei, espantada e quase engasgando... e descobrindo o motivo do receio dela.

– Então... eu li a notícia... alguém da Clinica onde você trabalha mandou e-mail pra um portal... eles foram lá... e entrevistaram a Priscila e... seus chefes.

– Que maravilha... agora, além de ser reconhecida na rua, nos bares, no hotel... o pessoal da Clínica deu minha ficha... essas coisas só acontecem comigo – comentei com um longo suspiro.

– Tenho mais umas vinte manchetes... errr... umas três sobre você... quer que eu continue?

– NÃO! Não quero saber de mais nada disso... que tal algumas notícias boas? Quem sabe melhora meu humor.

– Tá... nosso canal do YouTube que tinha doze mil seguidores... passou de meio milhão agora de manhã... o produtor dos shows de abertura ligou e implorou pra Lucy não fechar nada com ninguém até voltarmos pra São Paulo... os shows que ainda vamos fazer esgotaram os ingressos... tenho mais de dez pedidos de entrevistas pra Lucy... convites de programas de auditório... uma marca de lingerie quer a Lucy como garota propaganda... ela... é a sensação das redes sociais no momento...

– Tá, entendi... pelo menos algumas coisas boas surgiram...

– Tem várias coisas pra você também, mas você mandou recusar tudo...

– Claro... não sou artista... só me faltava essa – respondi, voltando a beber meu shake.

– Então... eu não recusei, pedi para entrarem em contato com você quando voltasse a São Paulo... errr... e dei o telefone da sua casa...

– COMO É?????? – gritei, quase engasgando de novo.

– Não fica brava Doutora... tem entrevistas, comerciais e outras coisas que só querem se forem as duas... então preferi deixar você conversar com a Lu e ver o que vão fazer... eu... nunca vi ela tão feliz.

– Eu sei... tá, depois eu vejo... tadinha, ela anda tão ocupada aqui no Rio de Janeiro, que só nos vemos a noite, e minha gatinha tá sempre esgotada e feliz...

– É...

– Tá bom, Shirley... não estou brava nem nada... mas não tivemos tempo pra conversar até agora... o que você queria falar comigo? – perguntei, já que foi a putinha (apelido carinhoso agora) que pediu este encontro.

– Doutora... digo, Cristina... aconteceu tanta coisa... que nem sei por onde começar... mas o primeiro item é... desculpe... eu li o e-mail com calma e realmente... não diz que você traiu a Lu, pelo contrário... e eu... tentei separa-las... desculpe... mas já apaguei aquela droga...

– Tudo bem... mas você voltou atrás e me trouxe a Lucy de volta... está perdoada... apesar de que ainda não entendi tudo que houve naquele dia.

– Nem eu... só sei que... ao perceber que a Lu tava triste... eu não aguentei e precisei reunir vocês de novo... e fique tranquila... que quando isso aconteceu, eu só tava abraçando ela... não teve nem um beijo.

– Tudo bem, eu acredito... e agradeço.

– E... obrigada por não fazer a Lu me mandar embora... mesmo sabendo que ela não me ama... eu gosto da banda... e queria ficar mais um tempo.

– Pode ficar tranquila... primeiro, você me devolveu a Lucy... segundo, sem querer você que causou toda essa fama, então é justo que a aproveite... terceiro, você foi promovida a acessora de imprensa e está trabalhando pra caramba... e quarto, quando a Lucy for fazer shows, ela vai precisar de uma amiga para lhe fazer companhia, e não acho que tem alguém melhor que você para este papel – comentei com toda a sinceridade.

– Mas... você vai confiar em mim? Mesmo sabendo que sou louca pela Lu? Mesmo sabendo... que se ela me quiser, vamos... trepar o tempo todo?

– Este é o ponto, menina... eu amo e confio na Lucy... e se acontecer, não foi porque você quis, foi porque ela quis... Mas não se engane, ela nunca vai pra cama com você – respondi com confiança.

– Eu sei... e nem poderei abraça-la publicamente... ou serei a vadia que quer destruir o casal perfeito... e ela a vagabunda que está traindo a Doutora... só poderei dar um abraço no camarim ou no quarto... nossa relação vai esfriar.

– É a vida... mas pode continuar sendo amiga... rir... aproveitar a companhia... e seguir até achar a sua pessoa certa... eu achei a minha, e foi totalmente sem querer.

– Eu sei... e admiro e respeito o amor de vocês... e espero um dia ter o meu...

– Vai ter sim... mas pra te animar, faço um brinde – falei, levantando o copo do Shake – Um brinde a melhor e mais honesta rival pelo coração da Lucy que já tive, você Shirley.

Ela bateu seu copo e tomou um gole... em seguida o levantou de novo e disse:

– Um brinde, a incrível e bondosa mulher que sempre cuidou e protegeu o amor da minha vida... que nunca será minha...

Fiquei um pouco sem graça e com pena dela, mas bati o copo tentando não transparecer isso. De qualquer forma, ficamos em silêncio um tempinho, até que ela falou de novo.

– Sabe, nunca entendi o que a Lu via em você... mas hoje eu vejo – disse ela dando uma pausa e me olhando fixamente – Cristina, você é... fascinante... se meu coração não fosse da Lu, eu... eu... te beijaria agora mesmo...

Digamos que não esperava algo tão direto vindo dela, praticamente um murro... na realidade, foi o que pareceu que me atingiu naquele momento, já que senti meu rosto queimar, o coração acelerar e um pouco de falta de ar...

– Exagerada... não precisa... tentar me agradar – foi minha resposta, quase gaguejando.

– Não é exagero... estou até imaginando em detalhes como seria se a gente fosse agora mesmo pro quarto lá do hotel, quero dizer, para conversarmos melhor lá... digo, pra ver algumas coisas lá... não... nada, esquece... – se enrolou, totalmente envergonhada. Acho que o momento sinceridade havia cobrado seu preço naquele instante.

– Entendi menina, entendi... então, voltamos a falar depois... melhor você voltar para o hotel, não é? Vou ficar mais um pouco aqui... curtindo a vista.

– Sim, claro... pode pagar meu Shake? Te pago no hotel... você bate lá no meu quarto que eu... eu pago... sim, apenas isso... pago na hora... – disse ela, se levantando e se enrolando de novo.

– Claro... mas nem precisa pagar... pode ir... tchau... – falei, quase a chutando pra longe.

E ela foi... não podia acreditar... após tudo que aconteceu, ainda recebo uma cantada explícita da putinha que durante meses tentou roubar a Lucy de mim... ela só podia estar me provocando, até parece que essa vadiazinha acha que sou...

– Doutora... – ouvi a voz dela sussurrando bem perto do meu ouvido direito, ao mesmo tempo em que me abraçava pelas costas.

– Quê? O que-e foi? – balbuciei sem graça.

– Obrigada por tudo, de coração... você é... fascinante – falou bem baixinho, para em seguida me dar um beijo demorado no rosto... e se não estou louca, um pouco antes de parar de beijar, deu uma lambida bem sutil na minha bochecha... e me soltou... e foi embora.

E a trouxa aqui... não sabia onde enfiar a cara... devia estar mais vermelha que um tomate... e com o coração querendo pular fora do peito... desgraçada... só podia ser provocação... ela não pode me achar fascinante... mentirosa... e tão linda, digo, tão... safada... isso.

Nossa... que calor repentino... pensando bem... é melhor evitar ficar sozinha com essa menina... vai saber... melhor terminar meu Shake e esquecer este assunto... safada...


Naquela noite...

– Doutoraaa... sua gatinha tá tão cansada... ela não consegue nem brincar...

– Tudo bem meu amor... relaxa e descansa – falei, abraçando minha gatinha em conchinha.

Ela havia ficado o dia todo atendendo fans, participou de uma entrevista em uma rádio, fez duas lives na internet, tocou na praia em um palco improvisado... e correu para todo lado, desde que acordou... voltou para o hotel, jantou, tomou banho e agora, só agora depois das 22:00 hs, havia deitado... e tem um show de abertura amanhã a noite... e várias  entrevistas marcadas para depois do show.

– Se após os últimos dias, você ainda quisesse brincar essa hora, aí sim eu estaria preocupada – comentei rindo.

– Tô quebrada... tô moída... quero férias...

– Lucy, sua fama mal começou... você sempre procurou isso, agora aguenta...

– Eu sei... só to com saudades de ficar com minha dona... a propósito, queria te perguntar uma coisa... mas não fica brava...

– Claro que não... por que fica... ah, só pode envolver a putinha...

– Tadinha doutora... não sei por que, mas hoje senti ela tão triste, que fiquei com vontade de dar um abraço e um beijo nela... mas não dei, pensei que minha dona podia achar ruim... você acharia ruim?

Eu sabia porque ela estava triste, mas não iria contar pra Lucy... então, considerando tudo, creio que só restava uma solução...

– Lucy, eu confio em você e sei que minha gatinha adora essa menina... então... se você me prometer que vai ficar só no beijo, pode ficar a vontade, prometo que não vou ficar brava... mas pare no beijo...

– Sério Doutora? Eu... admito... gosto dos beijinhos dela, é gostoso, sabe? Mas se mudar de idéia me avisa, tá? Te amo tanto...

– Pode ter certeza que aviso... eu também te amo muito, minha gatinha...

– Hmmmm... faz carinho?  – pediu ela, toda manhosa.

– Claro... vou te alisar até você dormir...

– Brigada Doutora...

E cumpri a promessa... alisei a gatinha, alisei, alisei... e quando ela tava quase dormindo, ainda ouvi uma última frase, bem pausada:

– Te... amo... minha... dona...

– Eu também... bons sonhos...

É tão gostoso ouvir e sentir ela ressonar... desde a primeira noite, quando a levei pra casa após derruba-la na rua... ela ressonou tão tranquilamente em meu sofá, após encher a barriguinha. E agora, cinco anos depois, é minha esposa e ressona nos meus braços... a vida é estranha, mas a vezes, é boa também...

E essa turnê tão planejada e tão desejada, vai mudar nossas vidas... Lucy ficou famosa e requisitada... eu estou sendo reconhecida na rua (preciso aprender a lidar com a fama)... a putinha tentou nos separar e depois nos juntou... e eu (nunca imaginei que faria isso) acabei de dizer pra minha esposa, que ela podia beijar outra (maturidade, talvez?)... realmente é uma nova etapa na vida de todas nós.

Mas acho que o mais inesperado de tudo... foi ter me tornado um pouco amiga (???) da putinha... coitada, preciso parar de chamá-la assim... e essa lambida que deu no meu rosto? Ela deve estar muito carente, isso sim...

Bom, no fim disso tudo, creio que só sobraram duas preocupações... primeiro devo tomar cuidado com a putinha, digo, com a Shirley... nada de muita intimidade... e segundo, preciso contar pra Lucy sobre o beijo da Pri...

Mas isso... é uma outra história.

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